Comemorado hoje o Dia do Ecoturismo
(Suplemento Viagem do Jornal Estadão de 2002)
As datas comemorativas permitem momentos de reflexão sobre assuntos de interesse da sociedade e o Dia do Ecoturismo, neste 1º de março, nos oferece a oportunidade de aprofundar o debate sobre o seu atual momento no Brasil. Apesar de ainda emergente, a atividade tem demonstrado vigor e crescimento intenso nos últimos anos. Não obstante o enorme e tão propalado potencial brasileiro em se firmar como um dos líderes mundiais neste mercado, estamos muito longe de alcançarmos este objetivo.
A falta de uma política nacional clara para o desenvolvimento do setor, aliada à forma desorganizada e, muitas vezes, irresponsável com que as atividades ditas de ecoturismo vêm se desenvolvendo têm trazido preocupações aos governos locais, às organizações ambientalistas e às comunidades anfitriãs.
Programas públicos e privados, desenvolvidos sem planejamento ambiental e turístico adequados, desconexos entre si ou não coordenados sob a égide de uma política nacional podem pôr em risco nosso excepcional patrimônio de belezas cênicas e biodiversidade, assim como nosso legado histórico-cultural. Em nível local, destinos que já apresentam fluxos regulares de adeptos do ecoturismo apresentam deficiências graves como a ausência de legislação em turismo e meio ambiente, a indefinição de normas de uso do solo e de zoneamento ambiental e turístico, incipiente mão-de-obra especializada, carência de equipamentos de apoio ambientalmente corretos e de programas de controle e educação de visitantes e comunidades. Por outro lado, órgãos governamentais em todos os níveis, como a EMBRATUR, são carentes de uma estrutura organizada para as ações de políticas de fomento e controle da atividade.
Pelo lado do setor privado, muitas empresas, sobretudo as operadoras, não possuem critérios para o planejamento de suas atividades ou para a proteção da própria base dos recursos naturais e culturais que fundamentam seus negócios. Em alguns casos sequer há a preocupação em se auto-regulamentar, organizando-se para estabelecer diretrizes ou códigos de ética próprios. Há ainda aqueles que apregoam que o ecoturismo é "a tábua da salvação", que irá resolver todos os problemas socioeconômicos de regiões desfavorecidas. Neste caso, esquecem que o setor necessita, além da matéria-prima "natureza", de insumos e serviços variados para sua realização, os quais tendem a ser importados dos centros urbanos frustando as expectativas locais de renda e emprego. O ecoturismo, no entanto, não é uma panacéia. Experiências demonstram que ele deve ser integrado com programas de apoio ao desenvolvimento do extrativismo, da pesca, da agricultura e silvicultura, do artesanato e de variados e pequenos negócios e serviços de apoio.
Quando mal planejado(ecoturismo), pode ser mais um instrumento de degradação ambiental e cultural, ao invés de uma ferramenta para a conservação e desenvolvimento local.
Lideranças comunitárias e entidades ambientalistas têm criticado a forma como recursos e produtos são aplicados, favorecendo a implantação de negócios ecoturísticos insustentáveis e o aparecimento de produtos "eco" de qualidade duvidosa ou de alta periculosidade aos turistas. Criticam ainda a falta de uma política para o setor que seja articulada com a sociedade, sobretudo para evitar as situações em que as comunidades isoladas, e o próprio meio ambiente, vêem-se sem oportunidades de se sustentar diante de uma atividade que só os enxerga como produtos de consumo para o lucro imediato. Este ano foi declarado o Ano Internacional do Ecoturismo com o objetivo de promover o segmento como uma alternativa de desenvolvimento sustentável para regiões de paisagens exuberantes, de alta biodiversidade e com dificuldades de desenvolvimento econômico. Porém, a promoção em larga escala, feita por governos, empresas e imprensa, pode ter efeito negativo atraindo milhares de visitantes para locais frágeis e não preparados para a visitação, tais como áreas protegidas e indígenas.
A Organização das Nações Unidas e a Organização Mundial de Turismo, diante das críticas de ambientalistas e movimentos sociais de todo o mundo, perceberam este risco e estão tratando de ampliar o foco das discussões para que incluam, além dos modelos de sucesso, também as lições dos fracassos. Em maio, durante a cúpula de especialistas em ecoturismo em Quebec, saberemos se a sociedade global será de fato informada sobre as melhores políticas de governo, dos modelos exitosos de projetos para o setor privado e dos mecanismos de participação efetiva das comunidades.
Será possível também saber se as recomendações, os incentivos e as tecnologias estarão facilmente disponíveis, principalmente para regiões em desenvolvimento e detentoras de vastos recursos naturais e culturais, como a África e América Latina.
Se o ecoturismo no Brasil encontra-se em um estágio de desenvolvimento recente, o momento de introduzir uma política de âmbito nacional para o setor é agora e urgente.
Tal política deve orientar governos e legislativos para a implantação de suas estratégias de regulamentação e controle, assim como orientar agências de fomento para criar e facilitar o acesso a incentivos fiscais e financiamentos. Não se pode esquecer do estímulo ao acesso à capacitação e à tecnologias apropriadas ao empresariado e da promoção da conscientização e educação dos visitantes, entre outras prioridades. Melhor dizendo, precisamos de uma política nacional integrada que aproxime o desenvolvimento do ecoturismo aos objetivos de sustentabilidade social, econômica e ambiental.
Neste debate, deve-se garantir voz e indicar as responsabilidades dos diversos atores envolvidos, incluindo o governo em todos os níveis, as agências internacionais de fomento, o setor privado, as organizações não-governamentais de caráter ambientalista e social, cidadãos das localidades receptivas e também o próprio ecoturista.
Um comentário:
Muito interessante o vídeo. Adorei.
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